Header Ads Widget

Ultimas Notícias

6/recent/ticker-posts

Dia do Orgulho: LGBTs 50+ compartilham memórias e contam como lidaram com estigma em tempos de repressão


Pessoas que viveram gênero e sexualidade em outras gerações revelam como aprenderam a enfrentar a sociedade em tempos de maior repressão sexual e invisibilidade de existências dissidentes. Markus Antonny realizou casamento na década de 1990 e similou uma certidão de casamento, mesmo sem validade Arquivo Pessoal Há 34 anos, Markus Antonny entrava em um altar do candomblé vestido de noiva, como sempre quis, e mandou fazer uma certidão de casamento idêntica a do cartório, mas sem validade. Era uma forma de sentir que o casamento era oficial e que ele também tinha o direito a viver a vida com quem escolheu. Hoje, aos 59 anos, Antonny conta que a luta dele se soma a de outros LGBTs que nem sempre são lembrados: aqueles que tem mais de 50 anos. Siga o canal g1 Ribeirão e Franca no WhatsApp No Dia Internacional do Orgulho LGBT+, comemorado nesta sexta-feira (28), o g1 ouviu histórias e memórias de quem viveu o gênero e sexualidade em uma época bem diferente, com poucos direitos, pouca proteção e muita violência. Parada LGBT+ reúne milhares de pessoas em Ribeirão Preto Para o cientista social Lucas Pereira de Melo, professor da Universidade de São Paulo (USP) dedicado à temática, estas são pessoas foram submetidas a um sofrimento social devido à opressão e negação de sua própria identidade. "São pessoas que se reconhecerem como homoafetivas ou com outras identidades de gênero em um contexto em que sair do armário era muito mais complexo, quando se tinha uma experiência marcada pela clandestinidade e não era possível se manifestar no espaço público". LEIA MAIS Professor que vive com HIV ajuda pessoas a se livrarem de 'culpa' do diagnóstico: 'Processos de cura' No mês do orgulho, veja histórias de conquistas na comunidade LGBTQIAP+ em Ribeirão Preto E mesmo agora, com maior liberdade e proteção social e legal, as marcas dos tempos de opressão e invisibilidade ainda podem se manifestar de muitas formas na vida dessas pessoas, que se preparam para entrar na terceira idade. Markos Antonny se engajou na luta LGBT+ na cidade de Ribeirão Preto Arquivo Pessoal O envelhecimento na comunidade LGBT+ Melo explica que existem características específicas do envelhecimento na comunidade LGBT+ que devem ser observadas, uma vez que não se trata de pessoas e corpos que viveram segundo códigos sociais tradicionais, como a constituição de famílias consanguíneas, por exemplo. "Não existe só uma velhice. O discurso científico sobre a velhice sempre se construiu dentro de uma ideia homogênea, que parte dentro de um imaginário da ideia do avô, da avó, dentro do contexto da heterossexualidade e cisgeneridade". Por isso, o especialista aponta que o desafio é compreender que são velhices, no plural, com diversidade, e é preciso discutir aspectos do envelhecimento que são específicos para esses grupos, como questões de saúde e de relacionamento. Por serem pessoas que, muitas vezes, tiveram problemas de relacionamento familiar junto com o despreparo de profissionais da saúde ou do acolhimento, como em casas de repouso, muitos LGBTs acabam tendo de 'retornar ao armário', o que é bastante violento, segundo o pesquisador. 'Pensei que ficaria grávido' Hélio de Almeida, de 63 anos, conta que passou por muita coisa antes de aproveitar sua recente aposentadoria. Aos 11 anos, antes mesmo de saber o que significava ser 'gay' ou 'homossexual', teve a primeira relação sexual com um primo de 18. Imediatamente, ele diz, o pensamento foi se "teria ou não engravidado" e como poderia "esconder a barriga dos pais". Helio de Almeida fez carreira no Hospital das Clínicas e foi arrimo de família Arquivo Pessoal Pouco tempo depois, aos 14, uma amiga contou à mãe dele sobre sua sexualidade, mas ela não criou grande caso. A situação mudou quando o pai pegou uma carta de um namorado. Hélio foi mandado para a roça, onde, segundo o pai, ia cortar cana e colher algodão para "virar homem" e também foi proibido de sair de casa. "Em casa era muita briga, muita confusão. Me chamavam de viado, de bicha. Me chutavam, me humilhavam", conta. A violência física veio do irmão, um ano mais velho, que o agredia e chamava outros amigos para bater nele. "Até que um dia eu enfrentei. Tinha o telhadinho que cobria o relógio de luz e ele me deu um empurrão. Eu peguei uma das telhas e joguei nele. Depois disso, nunca mais me incomodou". A situação mudou mesmo quando Hélio passou a trabalhar como auxiliar de serviços gerais no Hospital das Cínicas de Ribeirão Preto, em 1985, e se tornou arrimo dos pais, ganhando um salário mais alto. Ele acredita que passou a ser respeitado não por aceitação, mas porque passou a ajudar financeiramente a família. Casamento gay de véu e grinalda Na década de 1990, o casamento homoafetivo era impensável na sociedade, mas não para Markus Antonny, hoje com 59 anos. Ele se gaba de ter o primeiro casamento gay com direito a véu e grinalda de Ribeirão Preto. Entrou no candomblé todo de branco e sob a bênção dos Orixás para realizar o sonho e fez questão de produzir uma certidão de casamento igualzinha à feita em cartório, mas sem ter validade. "Naquela época foi o máximo. Ganhei o troféu diversidade por ser a primeira gay a casar na cidade. Minha família foi, os vizinhos foram, então foi muito assumido. Mas foi muito difícil as pessoas aceitaram o casamento entre dois homens", conta. Militante ferrenho desde os 14 anos, quando se assumiu, Markus diz que 'estar no armário' nunca foi uma opção. Ele também deu vida à drag queen Stella Fernanda Barba, que usa para performar e dar vazão à sua arte. Stella Fernanda Barbara é drag queen de Markos Antonny Arquivo Pessoal 'Me escondia no bar para namorar' Para Rita de Cássia Pantoni, de 59 anos, o trabalho foi uma forma de construção da identidade. Ela começou aos 9 anos e aos 16 teve uma oportunidade única de fazer um intercâmbio e sair do país rumo ao Japão. Rita foi presidente do Rotary de Ribeirão Preto na década de 1990 Arquivo Pessoal Rita conta que passou a sustentar a família financeiramente muito cedo, motivo pelo qual acredita que ficou mais protegida do preconceito e discriminação. Trabalho e sucesso profissional passaram a ser formas que ela encontrou para garantir respeito. Rita se formou em Direito e, em 1994, se tornou presidente do Rotary Club de Ribeirão Preto. Hoje ela está no segundo casamento de longa duração, mas conta que passou por conflitos com relação à sexualidade quando era mais jovem. Naquela época, segundo ele, a alternativa era viver em guetos. "Quando tinha 25 anos, me escondia por ser gay. Tinha um bar na Rua Florêncio de Abreu, a gente se escondia no fundo para encontrar uma namorada. Hoje as pessoas andam de mão dadas, não se vive mais com medo." LGBTs 50+ contam histórias e vivências no dia do Orgulho LGBT+ Arquivos pessoal Respeito por quem 'abriu caminho' Hélio destaca que todos vão passar pelo processo de envelhecimento e diz para a juventude que, para que eles tenham usufruído dos direitos, a geração dele lutou bastante no passado. "Eu não nasci velho. Pensam que a gente já nasceu velho, esquecem que tivemos a mesma idade e se está bom hoje é porque lutamos muito para isso. E não tem nada garantido, se afrouxar, perde tudo de novo, nos engolem de novo", afirma. Rita acredita que as pessoas hoje estão mais seguras e tem maior liberdade de expressão do que em sua época, mas ainda assim, confessa que ainda precisam se esconder no armário para não sofrerem retaliações e prejuízos na vida. Já Markus, admite que tem medo do futuro. "Eu me sinto muito sozinho, apesar de ter muitos amigos. Perdi minha mãe há dez anos e moro sozinho. Sempre estou buscando novos amigos para não ter a solidão, mas é muito difícil. Vejo a velhice chegando". Veja mais notícias da região no g1 Ribeirão Preto e Franca VÍDEOS: Tudo sobre Ribeirão Preto, Franca e região

source https://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2024/06/28/dia-do-orgulho-lgbts-50-compartilham-memorias-e-contam-como-lidaram-com-estigma-em-tempos-de-repressao.ghtml

Postar um comentário

0 Comentários